15 de ago. de 2009

Desafinado

João Gilberto e Stan Getz - Desafinado

Confissão singela de amor de falta de talento para o canto ou afirmação de uma nova estética musical? Sob a aparência despretensiosa, "Desafinado", na interpretação memorável de João Gilberto, tem muito mais cálculo, ironia e metalinguagem do que se espera de uma simples canção romântica. Por meio de uma alteração que faz na escala da frase inicial, na primeira sílaba de “desafinado” e na palavra “amor”, do inconfundível verso “Se você disser que eu desafino, amor”, o intérprete criou intervalos melódicos que tiram a música dos trilhos tradicionais e reforçam sua consagração como canção-manifesto da bossa nova. O “panfleto” foi feito muito mais de sussurros e entrelinhas do que de palavras de ordem, bem de acordo com o espírito de um movimento capaz de brincar com a própria sofisticação e declarar “Isso é bossa nova/ Isso é muito natural”.

Fruto da parceria entre Tom Jobim e Newton Mendonça, que gerou, entre outros sucessos, "Samba de uma Nota Só" e "Meditação", "Desafinado" foi gravada pela primeira vez e lançada em fevereiro de 1959. Autor da letra e um dos grandes talentos da fase inicial da bossa nova, Newton Mendonça morreu no ano seguinte, vítima de problemas cardíacos, aos 33 anos.


A canção surpreendeu pela aparente simplicidade do canto, quase uma conversa ao pé do ouvido, a letra despojada, os acordes alterados e um jogo rítmico ambicioso entre o violão, a bateria e a voz de João Gilberto. “O Desafinado evidentemente não é desafinado. Quando o João Gilberto gravou essa música, saiu na imprensa que ele era desafinado, mas que tinha uma voz muito bonita, tinha muita bossa. Desafinado não tem nada de desafinado”, diria Tom Jobim anos depois.


Nascida da observação de personagens da noite carioca ou apenas da ousadia de seus autores, o certo é que "Desafinado" se tornou um dos grandes hits e música-emblema da bossa nova também no exterior. Quando Charlie Byrd e Stan Getz gravaram a canção em roupagem jazzística, o single chegou rápido ao primeiro milhão de cópias vendidas, ficou 70 semanas no topo das paradas e conquistou um Grammy por melhor performance de jazz em 1962.
O sucesso abriu caminho para que os “garotos da bossa nova” chegassem a tocar no Carnegie Hall, em Nova York, templo oficial do jazz erudito. O concerto projetou no Estados Unidos os nomes de Sérgio Mendes, Carlos Lyra, Oscar Castro Neves e, obviamente, João Gilberto e Tom Jobim, que depois viriam a gravar com Stan Getz o célebre Getz/Gilberto, em 1963.


Por fim, Frank Sinatra convidou Tom Jobim para gravar um disco com ele. Seria uma pequena, mas feliz inversão da via de mão única da cultura popular mundial. Até então acostumados a despejar por aqui sua produção em massa, os norte-americanos começaram a importar um "desarranjo" só nosso.
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Fonte: Revista Bravo - 100 Canções Essenciais da Música Popular Brasileira
Colaboração: Fabio Eça.

Um comentário:

Anônimo disse...

FANTÁSTICO,J.R. ...

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