11 de mar. de 2010

Karyme Hass em entrevista sobre novo cd

Cantora curitibana fala de amizades e decepções nos contratos com gravadoras



Desde os 15 anos de idade, a curitibana Karyme Hass tenta se firmar como cantora. 12 anos depois, ela apresenta o resultado deste trabalho no seu segundo CD, Amor Solene, que será lançado neste domingo (22) no SESC da Esquina. Ela, que teve no contrato com a primeira gravadora a esperança de realizar seu objetivo, passou por momentos complicados com a rescisão do contrato causada por mudanças na gerência da empresa.

Depois de amizades e decepções, ela voltou para Curitiba onde vive no meio artístico e prestigia sua cidade e família. É sobre isso que a cantora falou em entrevista a Gazeta do Povo, na qual falou ainda sobre a dificuldade de trabalhar com arte.

Karyme comentou sobre a cena musical curitibana, e disse que as pessoas deveriam “prestigiar o que é nosso”. Do tempo que passou em São Paulo e Rio de Janeiro, ela coleciona boas amizades e parcerias. No seu novo CD, chamado Amor Solene, ela contou com várias parcerias de peso, como uma música escrita por Samuel Rosa, do Skank, e os violões de Paulinho Moska na canção "Carne Vermelha". Na produção, o amigo Nilo Romero, que já trabalhou com Kid Abelha, Cazuza e Ana Carolina. Confira as respostas.

Você batalha para se firmar como cantora desde os 15 anos. Como você começou sua carreira?

Desde os 15 eu fazia noite (apresentações em casas curitibanas). No caso, a partir dos 19 que eu comecei a entrar em estúdio para fazer discos. Eu entrei em um estúdio bem simples aqui de Curitiba, com alguns amigos músicos, e a gente desenvolveu os arranjos das canções que eu já tinha composto desde os 14 anos. O pessoal começou a achar o trabalho bacana e eu comecei a desenvolver uma música atrás da outra, até chegar ao nível de ter o material todo pronto para gravar o Tempo de Gritar, que foi o meu primeiro CD independente que eu gravei em São Paulo. Foi quando eu me mudei para São Paulo e fiquei seis anos lá.

Você se mudou para lá para seguir a carreira de cantora?

Eu cheguei e falei bom, ‘vamos para São Paulo’ para pegar um pouco de cancha, para conhecer outras tribos, para ter outras influências e ver o que acontece. Foi uma questão de experiência de vida mesmo.

Para esse CD independente você teve algum incentivo financeiro?

Esse CD eu trabalhei sozinha, e mandei para as maiores gravadoras do Brasil. Três gravadoras entraram em contato comigo que foi a Sony BMG, a EMI e a Warner. Eu tive três reuniões muito positivas, e a que me deu a melhor proposta na época foi a BMG, que o Jorge Davidson era vice-presidente. Só que ele migrou para a EMI em seguida e me levou junto. Com a EMI eu lancei o Faces e Fases, fiz todo um projeto de lançamento do material, e agora estou lançando o “Amor Solene”.

Esse seria então o seu terceiro CD?

De mercado, seria o segundo. O independente não entra porque eu não coloquei para tocar, não o divulguei.

Então as músicas do primeiro CD de mercado são as mesmas do CD independente?

Exatamente. Só duas músicas foram excluídas do repertório.

A composição destas músicas você faz sozinha?

Eu tenho algumas que eu faço sozinha e outras com parcerias.

Você continua com o apoio da EMI no Amor Solene?

Este trabalho eu estou fazendo independente também. Houve uma mudança de presidência na época do lançamento do Faces e Fases. Saiu o Beto Boaventura, que era o presidente e entrou o Marcos Maynard. Tanto que o Marcos Maynard na época relançou o É o Tchan, colocou o Latino em ênfase. Todos os trabalhos de MPB que estavam contratados no casting na época foram rescindidos. Quando entra uma nova galera, eles querem apostar no que eles descobrem. É mais ou menos assim que funciona o mercado.

E foi nessa época que você voltou para Curitiba?

Eu fiquei em São Paulo ainda, trabalhando o Faces e Fases, cheguei a me apresentar em algumas casas. Mas foi um trabalho com uma expressão um pouco menor por causa de investimento financeiro. Aí já muda um pouquinho. Passou um tempo e eu resolvi voltar para Curitiba para ter um contato maior com a minha família, com a minha cidade. Eu sou mãe, tenho uma filhinha de oito anos que se chama Ana Julia. Eu pensei mais nela nesse aspecto. Aqui, por incrível que pareça, eu tive boas surpresas. A cidade me acolheu de braços abertos e me deixou respirar. Foi nisso que nasceram as canções do disco Amor Solene. Um exemplo disso foi a música "Estrada de Flores" que eu compus pensando na descida da Estrada da Graciosa.

Um tema bem curitibano. Você é de Curitiba mesmo?

Eu sou daqui de Curitiba. Eu estou fazendo o lançamento do disco justamente priorizando a minha cidade, prestigiando a minha cidade.

Você mistura pop, rock, MPB e música eletrônica. Como você conceituaria o seu trabalho?

Eu navego na MPB pop. No disco eu tenho samba, tenho jazz, tenho blues, e tenho também o pop, as baladas. Eu conceituaria como MPB. Esse disco foi produzido pelo Nilo Romero que foi um grande amigo, produziu o disco anterior Faces e Fases. Lá no Rio, onde eu fiquei quatro meses produzindo esse trabalho, eu fui assistir a um show do Paulinho Moska. Fizemos uma amizade muito interessante e ele topou participar do meu CD, nos violões de "Carne Vermelha", de samba. Foi muito interessante, muito bonito.

Foi a primeira vez que você fez um samba?

Exatamente. Foi o meu primeiro samba registrado. Ele gostou bastante. Ele topou, falou ‘espera aí que eu vou tocar o violão com você’. Eu falei poxa, maravilha. Eu ganhei uma música do Samuel Rosa, chamada "Simplesmente", que também ficou maravilhosa. É uma balada mais para o rock.

Como que foi a parceria para essa música?

Bom, através do Jorge Davidson, ele passou essa canção para mim. Eu ouvi e gostei do material, coloquei a voz e mandei para o Samuca. Ele curtiu a canção, e aí ele falou ‘beleza, grava que está lindo’. Outra amizade também foi com o Rodrigo Bittencourt, compositor de "Samba Meu" da Maria Rita. A gente conversou e ele falou que ia me dar um presente. Ele compôs do dia para a noite uma canção chamada "Animal". A gente sentou, ele me apresentou a canção, a gente começou a cantar junto e eu falei ‘vamos gravar nesse disco comigo’. Foi muito gostoso. Esse disco incluiu muito, é um trabalho bem acabado.

Você também gravou uma versão de "Close to You", dos Carpenters. Como foi feita a escolha por essa música? A versão em português foi feita por você?

A versão é chamada de "Sonho Azul". Eu compus a canção junto com o meu parceiro Tony Arruda, hoje ele mora em São Paulo. Eu peguei e enviei para o pessoal da Fermata do Brasil, editora que contém os direitos autorais da canção. Mas sabe quando você manda despretensiosamente? Vamos ver, o que der, deu. O que aconteceu foi que eles me retornaram positivando o pedido para que eu pudesse colocar no disco. Isso para mim foi uma vitória. Ficou muito bonito mesmo.

O Nilo Romero (produtor que já trabalhou com Kid Abelha, Cazuza, Ana Carolina e Frejat) produziu os seus dois CDs. O fato de você ter saído da gravadora não impediu a parceria?

Não impediu porque nós somos até parceiros em composições. A gente foi além da gravadora. Nós criamos uma amizade musical mesmo. Então sempre que ele precisa de mim aqui em Curitiba ele me dá um toque. Uma vez eu encontrei uma guitarra para ele quando ele veio fazer um show para o Chimarruts aqui em Curitiba, foi uma loucura a gravação do DVD. Ele precisava de um violão, e eu falei ‘espera lá que eu arranjo para você’. Então a gente tem uma troca de amizade mesmo.

Sobre a cena curitibana, que inclusive você disse que foi muito bem recebida aqui, você acha que há incentivo para artistas locais?

A consciência musical em Curitiba por incrível que pareça está mudando para melhor. Eu sinto uma atmosfera maravilhosa aqui. Você pode até perceber, volta e meia está abrindo casa de shows. O John Bull acabou de abrir uma casa nova para shows. O Yankee que é também uma casa super interessante, tem dois palcos, um médio e um grande, com aparelhagem. Então o pessoal está investindo. Os cachês pelo que a gente vai vivendo aqui estão também aumentando. O povo curitibano está consumindo mais música. O único conselho que eu tenho para dar para todo mundo aqui, que é uma coisa que eu sigo sempre é prestigiar o que é nosso. É isso que Porto Alegre faz, é isso que São Paulo faz e é isso que o Rio faz. Curitiba passou da hora. A gente está precisando fazer isso, prestigiar o que é nosso. A nossa cidade é maravilhosa, tem uma infra-estrutura sensacional, parques lindíssimos. A gente precisa é mostrar o nosso lado artístico também. Nós temos e é muito rico.

Tem muitas bandas que acabam ficando apenas nos covers.

Exceto essas bandas que gostam de apostar no certo, mas na verdade, na minha opinião, é o incerto. O certo para mim é você investir em algo que você cria. As pessoas têm que começar a perder esse medo de falar que vão procurar algo lá fora. São Paulo, por exemplo, não me acolheu tão bem quanto a minha cidade. Hoje a repercussão do meu trabalho é muito maior sendo aqui. É por isso que eu sinto que a consciência musical de Curitiba está diferente.

Em que artista você se inspira ou vê como modelo?

Tem uma que eu gosto musicalmente falando, vou frisar bem isso, que é a Amy Winehouse. Eu gosto muito do vocal dela, ela maravilhosa, tem uma postura linda. Só que infelizmente tem uns outros probleminhas que a gente já sabe quais são. Tem outra que eu me inspirei muito, que foi uma das primeiras vozes que eu ouvi desde a adolescência, que foi a Elis. E também a Marisa Monte, gosto muito do trabalho dela. Não é nem questão vocal, é a questão de postura artística. Ambas são focadas, são direcionadas, sabem o que fazem. Trabalham com a música como uma empresa. Claro, quando sobre no palco tem aquela seriedade e aquele coração e emoção que só público sabe dizer.

Nesse trabalho que é independente, você usa a internet e o MySpace para divulgar. Isso tem ajudado os artistas hoje em dia?

É um site gratuito, onde você coloca as faixas do seu trabalho, e pessoas visitam online, o tempo inteiro. Artistas também se conhecem através do MySpace. Então é muito interessante, eu ouvi falar que iam dar um jeito de cobrar, mas eu espero que não porque isso iria fechar um pouco a acessibilidade. Para nós artistas, esse mundo não está muito fácil.

Hoje em dia, inclusive, tem alguns artistas maiores que estão deixando as gravadoras para seguir um caminho independente.

Eles estão encarando o trabalho como uma empresa. Cada um tem a sua produtora, montam uma equipe séria e vão trabalhar, botam a cara na rua. É mais ou menos por aí que a coisa está rolando.

No caso você consegue se manter como cantora?

Eu faço show no Santa Marta, já tem outros locais que eu já cheguei a fazer. Só que agora o meu foco é teatro. Eu estou montando um show com toda uma infra-estrutura, com todo um conceito visual.

Hoje você tem 27 anos. Qual balanço você faria da sua carreira como um todo?

Eu diria que tudo foi muito válido. Tudo que eu vivi, todas as experiências negativas e positivas foram válidas para que eu chegasse nesse amadurecimento atual. Eu me sinto preparada. Não que eu não estivesse no Faces e Fases, mas hoje eu me sinto mais amadurecida para lidar com a situação, que não é muito fácil.

Para o futuro, então, quais seriam os planos.

No futuro eu quero sempre estar levando ao meu público o que ele espera de mim. O melhor, canções bonitas, idéias boas de presença de palco, de iluminação, de estética. E de preferência que a pessoa compre o disco e não ouça apenas uma faixa, mas sim o álbum todo. É essa consciência que se perdeu um pouco com a Internet. O pessoal não tem mais o costume de ir a uma loja para comprar o álbum do artista e ouvir inteiro. Ele baixa as músicas que estão tocando na rádio e faz uma miscelânea de tudo aquilo. Isso, culturalmente falando, não é muito interessante. O público deixa de conhecer a essência do artista. Normalmente as músicas trabalhadas em rádio, as mais conhecidas, são canções de mercado mesmo. Elas têm 3 minutos e meio, criadas para vender o trabalho.
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Fonte: Entrevista concedida ao jornal paranaense Gazeta do Povo, em 21/06/2008.


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