Elis Regina - Dois Pra Lá, Dois Pra Cá
Quase todas as composições da dupla João Bosco e Aldir Blanc foram feitas da seguinte maneira: o engenheiro e violonista mineiro João elaborava a melodia, gravava numa fita cassete e entregava para o médico e poeta carioca Aldir colocar a letra. Com um dos maiores sucessos da dupla, "Dois Pra Lá, Dois Pra Cá", não foi diferente.
Em 1974, João Bosco fez a base musical de um bolero e deixou a fita com Aldir do jeito que este gostava, sem prazo determinado para devolvê-la com letra. Assim, poderia ouvir sem compromisso urgente, sem pegar papel e caneta, deixando a música “entranhar” no letrista, como ele mesmo diz.
Aldir ouviu o bolero de João incansavelmente. Certa noite, voltava do bar para casa de taxi, quando se surpreendeu por começar a cantalorar sem querer uma letra em cima da melodia criada pelo parceiro. Desesperado, procurou dentro do carro algo para anotar, mas não encontrou. Ao chegar em casa, ficou novamente surpreso; lembrou de todas as palavras e “letrou a música por inteiro. Estava pronta "Dois Pra Lá, Dois Pra Cá".
Gravada na década de 70 por artistas como João Bosco e Emílio Santiago, seu registro definitivo foi justamente o primeiro, no disco Elis, pela Phonogram. No mesmo álbum, lançado em 1974, havia outro sucesso histórico da dupla João e Aldir, "O Mestre-Sala dos Mares". Faixa número 7 do disco, "Dois Pra Lá, Dois Pra Cá" teve Elis acompanhada no estúdio por um time e tanto: César Camargo Mariano (piano elétrico e arranjos), Luizão Maia (baixo elétrico), Hélio Delmiro (guitarra), Paulo Braga (bongô) e Toninho Pinheiro (bateria).
A letra foi inspirada nas lembranças e afetos da infância e da época em que Aldir beirava a maioridade. Quando pequeno, ele e os primos aprendiam a dançar bolero com Terezinha, a prima mais velha. Experiente e com uma voz que o acalmava, ela ensinava: “Samba é um pra lá, um pra cá. Bolero são dois pra lá, dois pra cá”. Mas foi da adolescência, época dos bailes, época dos bailes de debutantes, que veio a maior parte das recordações da letra. Certa vez, em uma das festas, Aldir – o menino trêmulo que na canção convida uma garota para dançar – bailava com uma menina quando o salto alto quebrou e ele a amparou e conduziu até a mesa dos pais. Dessa lembrança, surgiram os versos marcantes a talvez mais belos da música: “No dedo um falso brilhante/ Brincos iguais ao colar/ E a ponta de um torturante/ Band-aid no calcanhar”.
No fim de 1975, Elis estreou o histórico espetáculo Falso Brihante (em razão do verso da música citado) no Teatro Bandeirantes, em São Paulo, que registrou o recorde de 257 apresentações e 280 mil aspectadores nos 14 meses que permaneceu em cartaz. No ano seguinte, parte do repertório da apresentação foi gravada em um disco homônimo, com grandes sucessos como "Velha Roupa Colorida" e "Como Nossos Pais", de Belchior, e Tatuagem, de Chico Buarque e Ruy Guerra.
Em 1977, "Dois Pra Lá, Dois Pra Cá" ganhou uma espécie de continuação feita pela dupla João Bosco e Aldir Blanc, com o título "Falso Brilhante", mas não chegou a ser gravada por Elis.
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Fonte: Revista Bravo - 100 Canções Essenciais da Música Popular Brasileira
Colaboração: Fabio Eça.
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