6 de out. de 2009

Rosa


Marisa Monte - Rosa


Tu és divina e graciosa
Estátua majestosa
No amor!
Por Deus esculturada
E formada com ardor...
Da alma da mais linda flor
De mais ativo olor
E que na vida é preferida
Pelo beija-flor...

Se Deus
Me fora tão clemente
Aqui neste ambiente
De luz, formada numa tela
Deslumbrante e bela...
Teu coração
Junto ao meu lanceado
Pregado e crucificado
Sobre a rosa e a cruz
Do arfante peito teu...

Tu és a forma ideal
Estátua magistral
Oh! alma perenal
Do meu primeiro amor
Sublime amor...

Tu és de Deus
A soberana flor
Tu és de Deus a criação
Que em todo coração
Sepultas um amor...

O riso, a fé, a dor
Em sândalos olentes
Cheios de sabor
Em vozes tão dolentes
Como um sonho em flor...

És láctea estrela
És mãe da realeza
És tudo enfim
Que tem de belo
Em todo resplendor
Da santa natureza...

Perdão!
Se ouso confessar-te
Eu hei de sempre amar-te
Oh! flor!
Meu peito não resiste
Oh, meu Deus! O quanto é triste!
A incerteza de um amor
Que mais me faz penar
Em esperar, em conduzir-te
Um dia ao pé do altar...

Jurar
Aos pés do Onipotente
Em preces comoventes
De dor, e receber a unção
Da tua gratidão...
Depois de remir meus desejos
Em nuvens de beijos
Hei de envolver-te
Até meu padecer
De todo fenecer...

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A excelência do melodista Pixinguinha revela-se mais uma vez nessa composição. Otávio de Souza, que exercia o ofício de mecânico no bairro do Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, divide com ele a autoria dessa valsa de breque, que, pela beleza da letra e apuro da melodia, se tornou um dos clássicos da música brasileira. "Era um rapaz muito inteligente e que morreu novo", contou o próprio Pixinguinha, sem mais nada esclarecer sobre o parceiro. Não há informação de que ele tenha composto alguma outra canção que não Rosa.

Muito se especulou sobre a suposta identidade do mecânico. Uma das hipóteses levantadas é que seria um pseudônimo do compositor carioca Cândido Neves, o Índio, cujas longas e rebuscadas letras – em voga nos anos 30 – se assemelhavam ao estilo de "Rosa". Índio, que foi parceiro de Pinxinguinha em "Página de Dor", em 1938, teria vendido a letra para o autor de Carinhoso com a condição de nunca pedir os direitos sobre o pseudônimo Otávio de Souza.

Polêmicas à parte, a primeira e mais memorável gravação de "Rosa" é de Orlando Silva, que a registrou, ao lado de "Carinhoso", em um disco da gravadora RCA lançado em julho de 1937 e em cujos créditos não consta Otávio de Souza. Mas a harmonia de "Rosa" já estava pronta desde 1917 e tinha o nome de "Evocação" antes de receber a letra do mecânico. Os cantores Francisco Alves e Carlos Galhardo perderam a oportunidade de gravá-lo porque se recusaram a cantar "Carinhoso", que estava prevista para ser registrada na mesma sessão de gravação de "Rosa".

A valsa se tornaria uma das principais músicas do repertório do "cantor das multidões" e uma de suas favoritas, a ponto de ele deixar de cantá-la depois da morte da mãe, em 1968, pois "Rosa" o fazia lembrar-se dela. A interpretação de Orlando é impecável, com exceção de um erro cometido por ele, que entoa "sândalos dolentes" em vez de "sândalos olentes", como consta na letra original.

O rebuscamento da letra mantém-se em todas as estrofes e é um belo exercício de jogo de palavras: "Tu és divina e graciosa, estátua majestosa/ Do amor, por Deus esculturada e formada com ardor/ Da alma da mais linda flor, de mais altivo olor/ Que na vida é preferida pelo beija-flor". Chama a atenção da crítica o tratamento do eu lírico à mulher amada. Cortês e erótico, mas sem descuidar de um tom respeitoso (Oh! Meu Deus o quanto é triste/ A incerteza de um amor/ Que mais me faz penar em esperar/ Em conduzir-te um dia/ Ao pé do altar/ Jurar aos pés do Onipotente/ Em preces comoventes de dor), o discurso é uma confissão de trama complexa.

De difícil interpretação, sobretudo pelos poucos espaços de pausa permitidos pela letra, que se estende em três longas estrofes, e fazem com que o intérprete tenha poucos momentos para recobrar o fôlego, "Rosa" constitui um desafio para os cantores. Uma das interpretações mais recentes, a de Marisa Monte, em 1990, é bem-sucedida tecnicamente e recuperou a popularidade da canção.

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Fonte: Revista Bravo - 100 Canções Essenciais da Música Popular Brasileira
Colaboração: Fabio Eça.



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